terça-feira, 8 de março de 2011

A freira e o pecado.


Cena do filme "O Pecado de Hadewijch"

Como aquilatar a magnitude de um Espírito, se este não sabe discernir o Bem de modo tão pleno quanto aquele que também trilhou o caminho das Trevas?

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A monja cresceu no convento. Os únicos gozos até então conhecidos, antes mesmo do noviciado, eram de natureza puramente sacrossanta. Encerrada em sua cela, ficou três longos anos remoendo essa inquietante questão:

"Qual a natureza do pecado?"

Até que não mais se conteve. Com vinte e três aninhos de idade, saiu finalmente do seu cubículo e foi ter com a madre superiora. Queria discernir a sua vocação em meio ao chamamento do mundo.

Não obstante já ter feito a menina os votos, a madre não teve outra escolha senão dispensá-la. E acreditou, consternada, que acabava de perder mais uma serviçal para o irresistível poder do século.

A manceba despojou-se do hábito e, muito faceira, meteu-se num vestidinho florido, decote generoso e tamanquinho. Perfumada como uma flor exótica dos trópicos, ela transpôs os pesados portões do mosteiro e ganhou as ruas sedutoras do mundo.

É preciso esclarecer, sem pudores nem reservas, que a nossa heroína não teve igualmente nem pudores nem reservas ao fazer o seu mergulho nos prazeres da carne.

Caiu de corpo e alma (mais de corpo que de alma) no império da luxúria. Dançou, bebeu, abraçou, beijou, fornicou, adulterou. E fê-lo muito. E intensamente. E experimentou os espasmos mais intensos do orgasmo, sentindo o corpo alquebrado após longas sessões de bacanais. E sentiu o ranço das longas ressacas, o delírio efêmero dos entorpecentes, e cheirou e ingeriu e injetou e tragou.

Viveu, enfim, mais três longos anos toda a promiscuidade que sua idade e beleza puderam lhe permitir, quando finalmente foi bater no mosteiro, carregada de olheiras, enodoada pelas secreções de uma vida dissoluta, corrompida pelo lesbianismo e pela sodomia.

A madre recebeu-a um tanto apreensiva. A menina devassa pediu novamente o hinário, o hábito, o rosário e a cela.

Recuada no seu nicho, nossa heroína não chorou. Não rogou perdão. Somente agradeceu ao Pai na mais intensa e contrita jaculatória. E sussurrou a Ele, estremecendo de sublimado prazer, que nada, NADA EM TODO O COSMO se igualava ao gozo Íntimo, Inexcedível, Indizível, Indescritível e Inefável de uma alma galardoada pelo Seu Criador.

E viveu e morreu santamente. Mais santamente que qualquer outra monja sua contemporânea.

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